Quando a gente ama alguém de verdade temos que entender que muitas coisas envolvem o amor e, bingo!, uma delas é a insegurança. O que sentimos é tão bom e profundo que a gente tem medo que isso vire poeira, areia, fumacinha, vire nada, vire qualquer coisa não-importante a qualquer minuto em qualquer dia ou qualquer noite. A gente tem medo de virar um qualquer na vida daquele alguém que, pra gente, faz toda a diferença.
De uma forma ingênua acabo tendo (acabamos; somos todos carentes) um pensamento que entra na linha do eu-preciso-ser-a-pessoa-mais-importante-da-vida-dele-e-antes-de-mim-toda-e-qualquer-baranga-era-feia-esquisita-esganiçada-e-burra-e-todas-as-historinhas-que-ele-viveu-foram-bobas-fracas-e-não-emocionantes. Pronto, isso me satisfaz, fico feliz, pois eu quero ser única, especial, diferente, aquela mulher que fez a vida dele mudar, girar, revirar, modificar, acordar. Ter essa garantia de sim-eu-sou-a-boa-do-pedaço-e-tirei-ele-do-circuito-mulherístico-e-ele-está-amando-pela-primeira-e-única-vez-na-vida faz com que eu me sinta segura e muito, muito mais amada. É a nota fiscal do amor, meu bem, eu te amo, fica segura, fica na boa, fica tranqüila, tudo o que eu vivi até hoje é nada perto do sentimento que nos veste e dá a liga. Todas as outras são apenas outras e estão lá naquele passado que passou e que é distante, relaxa, fica calma, nada mais tem importância, a Alinne Moraes é uma mulher comum perto dessa beleza toda que você tem e não, você não está gorda.
É uma necessidade quase psicopata de saber que você agrada, que é bem vista, quista, bem amada. Todas as manifestações e mini-provas-de-preocupação fogem do pensamento. Não sai de cabelo molhado na rua, meu amor, você está doente. Toma um remedinho pra cólica, abre a boca, olha o aviãozinho, olha, que bonita, agora vai passar. Tem que dormir cedo, tem que dormir bem, tem que se alimentar direito, não, não fica assim, vem aqui que eu te cuido. Tudo isso no dia-a-dia. E você sabe o quão adorada é. Mas em uma madrugada chata você sai de giro e resolve encrencar com um fantasma que arrastou corrente pelos seus neurônios, colocando todo o seu sistema nervoso em um estado nausístico. Náuseas nervosas. Então você pega a ficha do passado e começa a perguntar miudezas e fatos que, como o nome diz, passaram. Carimbo de chatice na sua testa. Próxima neura, por favor.
Existe, por mais estranho que pareça, o medo de dar certo. Tudo está dando certo, ora bolas, alguma coisa ruim não vai acontecer? Não vai? Como assim, como assim? Olha que feliz, eu amo alguém, a pessoa me ama, uhu, que legal, bonito, beleza, lindo, divino, maravilhoso. E agora? Caralho, e agora? O que fazer quando as coisas dão certo? Somos um pouco burros; somos muito burros. A gente tem medo do bom sentimento, aquele que nos enche de luz e vida. Só alguém com uma insanidade total teria medo de estar feliz. Digo que não. Digo que sim, nem sei mais qual é a linha que divide a normalidade. Isso não importa. Digo que dá medo estar feliz. Somos muito burros; somos um pouco burros. É o medo que um dia acabe. A gente vive uma vida cheia de altos e baixos, ganha aqui, perde ali. É o costume: perder, ganhar, querer, conseguir, querer, desistir. É o medo do desconhecido, do conhecido, a gente tem medo. Insegurança, de novo.
O amor não é seguro. Viver não é seguro, você pode sair na rua hoje e morrer atropelado. Você pode descobrir que tem câncer, fazer quimioterapia, radioterapia, cirurgia, tomar mil remédios e morrer. Você pode levar um tiro bem no meio da cara. Você pode estar dentro de um avião e um grupo de terroristas explodir uma bomba lá dentro. Você pode cair da escada, bater a cabeça e fim, acabou, morreu, babaus. Você pode morrer de muitas formas. E, perdoe os traços mórbidos, mas você vai morrer um dia. Pode ser hoje, pode ser breve. Pode ser daqui a dez anos. Isso, desculpe o egoísmo, não me importa. Se você morrer, morreu. O problema é você morrer sem viver. Não temos segurança em cada passo, como teríamos no campo sentimental?
Talvez você fique velhinho com o seu par; talvez ele te coloque um par de chifres morenos de olhos azuis silicone e bunda dura. Talvez vocês casem, tenham filhos e passem as férias no Taiti. Talvez vocês casem, tenham filhos, briguem na justiça pela guarda dos mesmos, queiram se matar na frente do juiz. Talvez vocês permaneçam namorados por muitos anos e tenham cachorros. Talvez vocês casem, talvez não dê certo, talvez cada um vá pro seu lado e vocês apenas continuem namorando.
As possibilidades são muitas. Nós não temos garantias emocionais, notas fiscais e prazos de validade. O que nos resta é viver, domando a insegurança e sim, acreditando que ele diz a verdade quando repete que a sua boca é cem vezes mais bonita do que a da Alinne Moraes.