Até o ano que vem!

By | 09:06

Eu adoro o mês de outubro, não sei bem a razão. Em outubro tem primavera, flor cheirosa na árvore aqui da frente. Tem sabiá cantando de manhã, este ano teve horário de verão (nunca sei quando ele começa, às vezes é em novembro ou tô louca?). Tem o meu aniversário, que pra mim é uma data muito feliz. Tem o dia da criança, que é o meu segundo aniversário. Tem muito sol e colorido nas principais avenidas da cidade, pois as flores ficam bem exibidas querendo aparecer a qualquer preço. Adoro outubro, hoje é o último dia do mês. Me despeço com um quê de tristeza e saudade.


Não gosto de novembro. Eu sei, o mês vai chegar amanhã, eu deveria estar com um sorriso nos lábios e usar toda a minha educação, receber bem o convidado, mas preciso fazer desfeita. Não gosto e pronto. Em novembro o clima em Porto Alegre começa a ficar insuportável. Quente e abafado e quente e abafado, sol torrando tudo e todos, não gosto. Minha pele é sensível, não posso ficar muito exposta ao sol. Minhas sardas pedem socorro, fico morrendo de pena das coitadas. Em novembro começa aquela arrumação natalina. E você sabe que não gosto de Natal. Não gosto de decoração de Natal, de comida de Natal, de espírito natalino, você tem que ser bonzinho o ano inteiro. Não adianta chegar novembro e dezembro e você sair correndo para asilos, orfanatos e distribuir dinheiro, bala, brinquedo, fralda geriátrica. Tudo bem, é melhor fazer tudo isso do que não fazer nada. Mas acho uma bobeira o tal espírito natalino, a gente tem que fazer pelo outro todos os dias, nem que seja um pouco, o mínimo. E não virar um santo em época de natal pra depois voltar ao normal. Antes mesmo da árvore ser desmontada você já volta a ser quem era.


Novembro é aquele mês em que todo mundo começa a tirar o pó das caixas com enfeites de Papai Noel, anjinho, boneco de neve, sai de tudo, parece cartola de mágico. Aqui em casa a minha mãe tem não sei quantas caixas com pilhas e pilhas de cacarecos, o pior é que ela fica num agito só, adora arrumar tudo. E me chama. Me chama muito. Me ajuda, vem cá, arruma ali, coloca lá, isso, ai que lindo, agora coloca o Papai Noel na sacada. Sim, nós temos um Papai Noel suicida, ele fica pendurado na sacada, não sei como não despenca dali de cima. Se ele cai garanto que quebra pelo menos uma perna. E as luzinhas? Como a cidade fica piscando, meu pai! Confesso que alguns tipos são bonitos e elegantes. Mas o excesso é a alegria do brasileiro, pode ver pelo Carnaval. Não precisa de trilhões de luzes, por favor. Alguém avisa?


Dezembro aparece. Correria, correria, correria, final de ano, lojas cheias, supermercados cheios, ruas cheias, tudo cheio, eu fico cheia. Dá vontade de mudar para Marte e morar com algum alienígena. Não esqueça de um detalhe importante: tudo cheio em dias muito quentes, pois em dezembro o calor piora. Porto Alegre vira um inferno. Então o Natal vai chegando, preocupação com a toalha da mesa, com a toalha para secar a mão que fica no lavabo, aquelas coisas todas, você sabe, tudo tem que ter um Papai Noel costurado, afinal, é Natal, uhu. Não gosto daqueles figos nojentos que alguém disse que é bom e bonito deixar junto com o peru. O peru fica lá, apertado entre pêssegos, figos e sei lá mais que fruta em calda. Aquilo me revira os olhos, detesto figo de qualquer forma. Grande noite, muitos sorrisos, abraços em pessoas que você não vê em outras datas, a não ser no Natal, ceia, troca de presentes, algum tio bêbado vestido de Papai Noel, alguma criança esperta que puxa a peruca e a barba e descobre que aquele é o tio bêbado, choro de desilusão da criança que conta para as outras crianças, tumulto. Odeio tumultos. A noite do dia 24 termina, ainda bem. No outro dia o almoço é peru gelado com figo gelado com tudo que você já viu na véspera, a única coisa que muda é a cara de ressaca da parentada. Você sobrevive e começa a se cuidar, pois na próxima semana tem o novo ano. Planos, projetos, listas, quero ser melhor, em 2009 vou fazer e acontecer e vou deixar de ser tão bestalhona em alguns assuntos, vou ligar mais pra minha avó, vou ser mais paciente com quem me rodeia, não vou ser tão cabeçuda e blá-blá. O ano novo chega, você lembra de tudo de bom e de ruim e daquele figo horroroso no peru e chora. Você sempre chora quando muda o ano, chora ao lembrar de tudo o que foi bom, chora ao pensar na sua vida, a vida e os balanços, a vida e as retrospectivas, a vida e a vida.


Janeiro e fevereiro. Praia, calor, céu lindo, todo mundo pegando uma cor. Você odeia janeiro e fevereiro e férias de verão. Seria muito melhor ir pra um lugar que estivesse bem frio, de preferência nevando. Você é exagerada, tudo bem, nem precisava nevar, nem estar tão frio, mas calor assim só faz na casa do demo. Enquanto todo mundo se preocupa com o bronze você pensa em um jeito de fugir do sol. E a sua cidade é quente e muito quente e cheia de lagartixas. No verão elas adoram aparecer nas paredes de casa, principalmente nas do seu quarto. É o verdadeiro inferno: calor e lagartixas passeando. Só existe um lado bom do verão em Porto Alegre: a cidade fica mais tranqüila. Mas juro que eu adoro março. Em março a vida volta a funcionar. É que é assim: em novembro o povo começa a se preocupar com o Natal, o Natal chega e a preocupação é o novo ano, o ano começa e a preocupação são as férias no Ceará e depois que você volta mostra as fotos pra todo mundo e começa a se preocupar com o Carnaval, êê, Carnaval. Eu detesto Carnaval, acho uma putaria danada. Depois do Carnaval é que o ano começa de verdade. Me enganei, você precisa tirar uns dias de descanso depois dos agitos carnavalescos.


Vou aproveitar o meu último dia. Depois, nem sei. Acho que vou arrumar um bom sonífero e dormir até março do ano que vem.
Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial