Acomodando o pensamento

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Às vezes eu não entendo. Não é por falta de esforço, juro. Se nem eu me entendo, como você vai conseguir? Olha, sei que sou mimada, um pouco inconstante, intempestiva, por muitas vezes vulnerável e não sei lidar com um punhado de coisas. Mas fico insatisfeita com as não tentativas. Se acomodar, pra quê?

Sinto dentro de mim uma explosão. De tudo, principalmente de emoções. Elas chegam impiedosas, feito rajada forte de vento. Quase me derrubam, tento me segurar. Na verdade, tento segurar tudo porque quero tudo pra mim. Tenho um lado bem mulherzinha que precisa precisar, é por isso que tô sempre buscando algo. Mas isso não é do ser humano, Freud? O ser humano não está sempre insatisfeito, Jung? Chega de teorias junguianas e freudianas, isso pira a cabeça de qualquer um. Talvez eu tenha lido demais, não que eu seja melhor que os outros, mas os que não têm tantas aspirações, os que não conhecem tanto da natureza humana se contentam com uma vida quase normal. Por um lado, viver na ignorância dá um certo ar de felicidade.

Acho difícil falar, por isso escrevo. Não que eu não tenha tentado, Deus sabe que sim. Olha, tô meio em crise. Com tudo, é que eu tô conhecendo mais as pessoas e o mundo e as coisas todas e isso está me assustando tremendamente. Talvez você já tenha visto como são as pessoas e o mundo e as coisas todas há mais tempo e talvez, talvez mesmo, esse meu jeito não combine com o seu. Eu e meu pensamento que não cala. Eu e meu coração que vive dando cambalhotas. Eu e meu livro de conto de fadas embaixo do braço. Eu, sem nada. Sei lá, talvez isso irrite você. Não é todo mundo que quer conviver com um Peter Pan travestido de Rapunzel que está vendo como as coisas são depois de quase trinta anos. Só queria um pouco de compreensão: o mundo está me apresentando um festival de novidades. E eu, nisso tudo, me perco um pouco. Ao invés de me explicar que todo mundo que você conhece já passou por isso, podia só tentar entender. Não peço muito, me dê o que puder, da forma que conseguir. Eu aceito.

Fico triste ao constatar que as pessoas podem simplesmente se perder. Por quê? Por que não tentam? Por que vão perdendo a inocência e ingenuidade? Antes, viam tudo com olhos infantis, falavam o que dava na cabeça, abraçavam com força seus planos, viajavam em histórias tão puras. Antes, nada era mecânico nem ficava no piloto automático. Antes, não tinham medo do ridículo. Antes, tudo era motivo de comemoração. Antes, mais coisas eram valorizadas. Antes, pequenas coisas eram grandes eventos. Com o tempo, beijos são rápidos, o olho no olho vai saindo de cena, pensam e hesitam antes de pronunciar uma só palavra. Com o tempo, as músicas vão embora, o romance sai de fininho, o que foi tão bonito pega um lencinho e acena pela janela. Com o tempo, amizades podem ser esquecidas. Com o tempo, o amor por todo mundo pode ir ficando desbotado. Com o tempo, o cansaço pula no seu colo. Com o tempo, você pode acabar se sentindo sozinho no meio de uma multidão pulando no Carnaval. E você ali, vendo suor, alegria, confete e se perguntando: tudo isso pra quê?

Hoje cedo, carregando uma mala pela rua, pensei nisso tudo. Não sei o que pesava mais: se era a mala ou a realidade despenteada. Deu uma vontade louca de sair sem rumo, mas ao invés de correr eu caminhei devagar, pensando no que precisava ser feito. A mala pesava tanto que tive que parar um pouco, pra tomar um ar e ver a fisionomia das pessoas na rua. E me perguntei: será que elas não pensam o mesmo que eu? De repente, elas podem ter cansado de pensar e resolveram só viver. De bico fechado e sem questionamentos. Assim tudo fica mais fácil, não? É bem melhor do que embarcar numa trip complexa, profunda, que remexe em tudo e enlouquece.

Pouco a pouco, vejo que a vida não é bem como eu pensava. Nem tudo é o que parece, ilusão é só uma palavra bonita que se esconde atrás da realidade. Expectativas e idealizações nem deveriam ter nascido, não sei quem inventou tais palavras (e deu para elas algum significado). Mas eu não quero me tornar descrente, entende? Isso não faz parte de mim, essa não sou eu, não quero perder a minha originalidade. E se ela for errada? E se toda a minha essência for apenas uma coisa idiota insuportável de conviver?

Por tudo isso, faço perguntas matinais nascidas de um sonho. E posso até falar algumas coisas sem sentido. Mas são só perguntas, pra engatar uma conversa, pra manifestar e ouvir opinião. Não é pra escutar que eu nunca vou abandonar esse meu jeito ou que eu tenho mania de ver as coisas com olhos de princesa encantada. Eu não busco uma pessoa que está nos livros, quero alguém real. Mas o que eu quero, de verdade, é que o alguém real aceite a minha realidade. E ela é essa, se apresenta desse jeito. E não tem intervalos porque o meu coração nunca para.


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