Sobre as drogas

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Eu sei que o assunto é uma droga, mas alguém precisa puxar uma cadeira, abrir a boca e deixar o pudor. Normalmente, eles começam experimentando um golinho de cerveja. Depois, de vinho. Uísque. Vodka. Sentem o mudo rodar, a língua embaralhar. Então, alguém na escola diz ei, vamos experimentar isso aqui depois da aula? O “isso aqui” pode ser maconha, crack, cocaína, ácido, só Deus sabe. Não falar não resolve. É por isso que hoje, no Dia Mundial de Combate às Drogas, eu resolvi te escrever.

Já fui adolescente. Frequentei muitas festas, mas meu primeiro gole de bebida foi em casa. Meus pais sempre disseram “quer beber, bebe em casa”. Com uns 14 anos, tomei um gole de cerveja. Achei ruim demais. Então, comecei a sair, ir em festinhas com amigos. E é claro que esses amigos tinham amigos. E os amigos dos meus amigos eram, digamos assim, mais “soltinhos”. Dirigiam sem carteira de motorista, adoravam circular pela noite com um copo de uma bebida forte, muitas vezes vomitavam de tanto beber, ficavam com dois ou três na mesma festa, fumavam cigarro e sempre tinham alguma droga.

Quando eu tinha 15 anos, queria parecer mais madura. Por isso, comecei a fumar com uma amiga. Antes do sinal tocar, íamos para uma casa abandonada, onde ninguém podia nos ver e ela me ensinava a fumar. Lembro que a marca do cigarro era Free, a mesma que meus pais fumavam na época. Eu mal sabia segurar um isqueiro. Tossi muito. Naquela hora, nem pensei que tinha nojo de cigarro. Logo eu, que sempre reclamava da fumaça para meus pais. Logo eu, que pedia para eles pararem. Logo eu, que naquele momento estava segurando um cigarro e aprendendo a tragar. Tudo por causa de uma festa. Na festa, ia estar um cara. Ele era do segundo ano, tinha coxas grossas e sorriso frouxo, era alto e moreno, jogava futebol na escola e a platéia ia ao delírio quando a bermuda subia e deixava aquelas coxas morenas mais aparentes. Guilherme. Ele fumava. Cheguei na festa toda linda e loira e encigarrada. Guilherme me olhou, olhou, olhou, chegou pertinho e disse “que pena, uma guria tão bonita fumando. Detesto mulher que fuma”. E eu pensei: esse cara é louco! Não, a louca era eu. Fiquei sem o cara e com um vício.

Um dia, nossa turminha de praia, foi em um luau. Bebida, fogueira, cigarro, adolescência e maconha. Sempre tive medo de experimentar, então ficava só olhando e dizia não, obrigada. Meus pais não sabiam que eu fumava, mas sabiam de tudo sobre droga e bebida, porque eu contava quando me ofereciam. Tem certeza que não quer um pega? Tenho, sim, valeu. Apesar da curiosidade, eu tinha medo. E se eu gostasse? E se fosse bom? Melhor não saber. Até que chegou o Grande Dia. Porque uma hora a curiosidade aperta. Experimentei. Achei o gosto estranho. Meus amigos rindo, com os olhos vermelhos e pequenos. E eu comecei a entrar em outro mundo, um mundo mais leve, mais solto, menos real. Um mundo de riso, um quase sono e Moura Brasil. Não achei a oitava maravilha do mundo, mas foi legal. Então, meus amigos começaram a se reunir na pracinha toda semana. O pessoal jogava, conversava, ria, tomava chimarrão e fumava um. Eu ia junto, mas nem sempre fumava, tinha medo de me viciar naquilo. Fumei algumas vezes. E gostava. Até o dia em que parei de gostar. Pensei nossa, é isso que eu quero ser? É nisso que quero me transformar? Uma coisa é uma adolescente experimentar uma droga, outra coisa é a droga tomar conta da tua vida. E a droga tinha tomado conta da vida de muitos dos meus amigos.

A droga não escolhe idade, endereço, classe social, raça ou credo. Muito menos time de futebol. Ela chega com tudo. E no meu círculo de amizades era presença constante. Filhinhos de papai e mamãe, gente com grana, filhos de pais separados, filhos de pais casados, cada um com alguma neura, algum problema, alguma mágoa cravada no peito feito faca afiada. E comecei a perceber que todo mundo que curtia fumar um tinha alguma coisa complicada na vida. Eu sei, sei que a vida de todo mundo é complicada, mas entenda: adolescentes são diferentes. É aquela fase em que você se sente fora da turma, inadequado, narigudo, baixo, gordo, feio, ninguém te ama e ninguém te quer. É claro que existem outras realidades. Tem gente que usa droga para esquecer a pobreza, a fome, o frio, a violência, a dor. Não importa o motivo, mas a droga é sempre uma muleta, um estepe, uma bengala, um apoio. Uns bebem. Outros fumam maconha. Outros cheiram lança perfume. Outros usam crack. Outros usam cocaína.

Além da maconha, experimentei outras drogas por curiosidade. Depois disso, segui minha vida. Muitos conhecidos e amigos seguiram na vida das drogas. Fraqueza? Não sei. Existe uma coisa chamada predisposição. Isso explica porque eu experimento e não me vicio e meu ex´-colega experimentou e se viciou. Além disso, também acho que tem a ver com a criação, ambiente familiar, personalidade. Na minha casa  a gente sempre conversou bastante, sobre tudo. Não existia essa de droga-é-assunto-que-não-se-fala. E acho que esse é o erro de muitas famílias hoje em dia. Não falam sobre droga, bebida, sexo. Por isso, os adolescentes bebem, fazem, acontecem, iniciam a vida sexual cada vez mais cedo. Não adianta você ter vontade se não tiver cabeça e informação. Tem que conhecer o corpo e os métodos contraceptivos, tem que saber o que é AIDS e doenças sexualmente transmissíveis. E entender que não são palavras complicadas. A realidade, sim, é que pode se tornar avassaladora se a pessoa não tiver orientação. E a orientação vem de casa. Não importa se é uma mansão com 5 suítes, piscina e jardim de inverno, um apartamento de dois quartos ou uma casa onde toda família dorme no mesmo cômodo. Tem que sentar, conversar, explicar os perigos e os riscos. Tem que dar informação. E, principalmente, parar de achar que o problema nunca vai bater na sua porta.
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