Tudo o que não era para ser...É!!!
Internacional é campeão do mundo: parabéns. Valeu, foi bom, adeus. Adeus, Tóquio. Tchau, Japão. Inter é campeão, as avenidas gaúchas estão em festa, Porto Alegre está vermelha, buzinas estão a mil, colorados estão felizes e saltitantes, homens, mulheres, garotos, garotas, bebês. Todos faceiros. Ótimo.
Eu sou gremista, mas não estou revoltada. Não sou criança, nem recalcada. Torço, em primeiro lugar, pelo Brasil. Em segundo, pelo Rio Grande do Sul. E em terceiro, pelo Grêmio. É, sou assim. Não brigo, não discuto futebol, nunca vou a estádio, não sou fanática, nem tenho camisetas do meu time. Muitas vezes o Grêmio joga e eu nem assisto (maioria das vezes). Acho incrível como uma bola modifica milhares de vidas. Como uma trave transforma pessoas. Como um gol faz milagres. Futebol mesmo eu assisto na Copa. Copa do mundo tem de 4 em 4 anos, não é? Então vocês vão esperar mais 4 aninhos para me ver vidrada na bola que vai e que vem e que tenta entrar na rede. Não entendo de regras, não sei nada disso. E nem quero.
O que me espanta é ver que as pessoas simplesmente nem ligam. O país numa crise desgraçada. Esses políticos de merda (e bosta) tiveram um aumento de 90% no salário, enquanto crianças de pés no chão e ranho no nariz batem no vidro do teu carro pedindo uma moeda. Adolescentes se agrupam para cheirar cola. Passamos por bairros menos favorecidos, ruas de paralelepípedo (por isso andamos um pouco mais devagar) e a cena é essa: 2 ou 3 garotos chegam perto do teu carro para oferecer maconha e cocaína. Hospitais têm um atendimento péssimo. A educação brasileira está pior do que o aquecimento global. Alguém buzina por causa disso? Alguém grita? Alguém protesta? Se impõe? Se manifesta?
Quem acorda cedo, num domingo, para debater assuntos desse tipo? Quem se preocupa com a criancinha piolhenta que está com vermes e tomando água suja? Quem se importa com aquela senhora que teve a casa destruída por um forte vendaval? Quem se preocupa com a fila gigantesca que os pacientes do SUS têm que enfrentar? E com o menino que não conseguiu fazer um transplante devido aos problemas de atraso nos vôos? Ninguém. Você pensa nisso, mas pisca os olhos, afasta essas imagens da cabeça. E toca a vida. Uhu, mas vamos buzinar para o Inter, é a primeira vez que o time é campeão do mundo. Pois eu digo: foda-se. Querem me atirar pedras, atirem. Fodam-se.
Tudo o que não era para acontecer, acontece. O pior de tudo: nós vemos, nos importamos, ficamos impactados e...esquecemos. Nossas vidas são corridas, temos muito o que fazer, não é mesmo? Pois eu não esqueço. Eu não aceito. Eu não tolero. Faço pouco, gostaria de fazer bem mais. Mas não sei ficar calada, ver cenas que me tocam e entrar no shopping e comprar uma calça de R$1.000,00. Não sei! Essas coisas ficam presas na minha garganta.
Não dá pra ver e aumentar o som. Vamos colocar uma música bacana e esquecer os problemas, males e dores do mundo. Não. Abaixa a música. Te encontra com o teu silêncio. Pensa em tudo isso.
O mais importante não é ter, possuir, aparecer, conquistar e ser alguém. Dinheiro é bom. Poder é bom. Saúde é bom. Conforto é bom. Paz é bom. Têm muitas coisas boas por aí. Mas a melhor delas é sentir. E nunca perder a capacidade de sentir. Tudo. Bom e ruim. E, acima de tudo, ser solidário com você e com o seu sentir. Mais nada.
Sobre o blog
Clarissa Corrêa
Clarissa Corrêa é escritora e redatora publicitária.
É autora dos livros Um pouco do resto, O amor é poá, Para todos os amores errados e Um pouco além do resto.
Já foi colunista do site da Revista Tpm, do Vila Mulher e do Donna.
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