Eu não sou legal, não mesmo. Acho que sempre tenho razão e quando minhas previsões dão certo olho com a cara mais abominável do mundo, dou um sorriso irônico e falo o clássico “eu te avisei”. É que, em geral, eu tenho razão. Essa é a primeira –e mais importante – coisa que você precisa aprender a meu respeito. Nunca, nunca me contrarie. Não sei receber elogios, fico sem saber o que fazer, me atrapalho e acabo trocando de assunto – quando não troco as pernas e tropeço em algum canto de mim. Sorrio para disfarçar desconfortos. Se eu não gosto de você é bem provável que você tenha medo do meu olhar. E eu posso simplesmente não gostar de você de graça. Se eu gostar de você aviso de antemão que você é uma pessoa de sorte. Eu me entrego. Quem vive comigo sabe. Quem convive comigo sente. Se você se estatelar no meio do asfalto eu vou estar lá para recolher cada pedaço perdido. Acharemos uma cola, inventaremos uma solução mágica, criaremos alguma fórmula. Se você conquistar aquilo que sempre desejou eu estarei lá com meus abraços esmagadores e com meus aplausos. Quer saber mais? Eu estarei feliz de verdade por você. Sabe por quê? Eu vou dizer: é fácil dar a mão para quem está no fundo do fundo do poço. É muito bonito e legal ser solidário na dor. E a alegria? Quem consegue dividir uma alegria sem sentir uma ponta de inveja, recalque ou rancor? Poucos. Se você achar alguém que a cada mini-sucesso seu fica com o coração sorrindo por você pode apostar que achou um amigo. E que esse amigo vale ouro.
No ano que passou posso dizer que muita gente me conheceu de verdade, o meu eu sem artifícios. Você já sabe: não sou legal. Eu me disfarço e, às vezes, uso máscaras sim. Uso e assumo. Não é qualquer pessoa que me conhece sem corretivos. Me mostro para quem vale a pena. Para quem entende. Entende o quê? O meu jeito de sentir. Mas minha intuição não é à prova de balas, ela falha. E ela efetivamente falhou no momento em que achei ter encontrado uma pessoa amiga. Pensando bem, eu tive alguns avisos, alguns sinais de que algo não ia bem. Como pode alguém ser tão legal e tão simpático? Como pode uma pessoa se importar o tempo inteiro com a sua vida, querer saber detalhes e mais detalhes e falar muito pouco de si? Como pode alguém gastar horas do dia furungando a vida alheia e tecendo comentários maldosos? Eu sou um poço de maldade e confesso. Acho que eu devia ser queimada numa fogueira, sabia? Tudo culpa da minha língua. Sou linguaruda mesmo, falo de quem merece. E assumo. Mas, sabe, não sou falsa. Sou exibida, cabeça dura, turrona, chatérrima e na tpm sou o demonho em forma de gente, mas não sou cínica. E detesto gente assim. Uma pessoa que se aproxima de outra para tirar vantagem, que fala de um determinado grupo de pessoas e depois está lá aos beijos, abraços e confidências? Você pode voltar atrás no que disse a respeito de alguém? Pode. Você pode ter se enganado na primeira impressão? Também pode. Tudo pode. O que não pode é usar da má fé. O que não pode é fazer um circo em torno de uma situação. O que não pode é vestir a roupa de pessoa boazinha, evoluída, super de bem com a vida, a mais feliz do mundo, a mais querida, a mais meiga, a mais solícita. E lá no fundinho ser a pessoa mais traiçoeira do universo. Isso sim é que não pode.
Como eu não sou legal, nada legal, remoí algumas coisas, pensei em todos os meus transtornos, sou cheia deles, éééé, sou louca, preciso me tratar, sou descontrolada, mentirosa compulsiva, desgovernada, acho que preciso tomar uns remédios tarja preta quatro vezes ao dia. Se isso não for suficiente, me alcança uns talheres de plástico, por favor. Preciso, também, de uma camisa de força, represento um perigo imenso para a sociedade.
Olha, minha vida é surreal, eu sou surreal. O mundo não é isso que todo mundo vê, isso é ilusão. O mundo está dentro de mim, é aqui que as coisas funcionam. Sou descontrolada e tenho orgulho disso, acho que deve ser muito triste controlar as emoções, não gosto, gosto é de sentir e pronto. Se eu me danar, azar. O que eu não admito é alguém dizer que te ama, você compartilhar a sua vida e os seus problemas com esse alguém e pimba, levar uma chapuletada. Isso não. Se na sua vida acontece tudo de uma maneira certa, se os seus passos são exatos, que bom, parabéns. Na minha não é assim não. Um dia a minha parede está pintada de rosa, no outro eu já quero uma decoração japonesa. Na semana seguinte quero pintar um painel e colocar na parede, no outro dia penso que ficaria melhor na parede do corredor. E isso não é bipolaridade, não é mentira, não é compulsão, não é loucura. O mesmo serve para você, não serve? Em um dia a fulana é uma hipopótama obesa que morre de inveja da amiga esbelta, a outra tem cara de cearense e é feinha da Silva Sauro e a outra parece um travesti com a sobrancelha arqueada. Não era? E hoje são as melhores pessoas do mundo. Pode ser que sejam. Se forem, que bom. Só não esqueça do que disse. Não esqueça quem você é. Nem as coisas que fez. Na hora da alegria é fácil distribuir abraços e arrumar um culpado. É ótimo poder inventar, aumentar e jogar a carga em cima de quem não está presente e nem tem como se defender. Da mesma forma que é fácil dizer que ama. Hoje em dia todo mundo diz que ama, ei, eu não sou legal, fogueira para mim, toca fogo logo, pô! Eu amo poucos. Mas esses poucos, pode apostar, amo muito.
Dizem que amigos têm que ser somados, não diminuídos. Nem sempre, nem sempre. Nunca gostei de frases feitas, gosto de inventar as minhas. Lá vai: dizem que amigos têm que ser somados só que, em alguns casos, alguns têm que ser esquecidos. E apagados da memória.
Não sou a pobre moça, fique sossegada. Sou rica, riquíssima de luz e energia pura, por isso eu espero que você tenha saúde e uma vida cheia de paz. Amém.
By Clarissa Corrêa | 15:56