Caixa de entrada

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(Os avanços da comunicação realmente facilitam a vida das pessoas?)




Eu aposto que a sua Caixa de Entrada deve ter uns quatro ou cinco e-mails não lidos. Você deve guardar com carinho aqueles que são mais bonitos, alguns inclusive deve ter mandado imprimir, para reler na próxima semana. Quando você chega no escritório a primeira coisa é: checar e-mails. A última coisa que faz antes de deitar é conferir se aquela resposta tão esperada está entre as mensagens novas. Antigamente não existia e-mail, computador, mensagem no celular; nem celular, nem Orkut, nem scrap, nem nada de nada. Antigamente você tinha que escrever com lapiseira grafite número sete, lápis, papel. Você sujava o papel com lágrima, café, tinta de caneta. Mas você não vive no mundo de antigamente, nem eu.

A internet facilita a vida das pessoas. Concordo com a afirmação. Você precisa saber se os pêlos dos leões ficam brancos com o passar do tempo: dá-lhe Google. Em que ponto fica aquela livraria que te indicaram? Mapa internético. Que presente darei para a minha mãe? Vai no Terra, clica na coluna "Dia das Mães". Na internet tem bula de remédio, filme pornográfico, música, livro, todo o tipo de informação. Você descobre coisas incríveis e perde muito, muito tempo com baboseiras. É um outro universo, um mundo paralelo, um pouco encantado, um pouco estranho.

Hoje em dia todo mundo pergunta qual é o seu e-mail e se você tem Orkut (ah, pode me dar o MSN também?). Não gosto disso. Pessoas têm rosto, gosto, humores. No MSN você coloca uma risadinha, várias carinhas; no Orkut todo mundo é lindo, gostoso e feliz; os e-mails são frios. Nada substitui uma carta. O envelope, a folha escolhida delicadamente, o cuidado ao escrever, o erro, a emoção nas linhas. E-mail não tem isso. É um Arial ou um Times e fim, leu, tá lido. Por mais que você imprima nada é maior do que o romantismo da carta, por isso eu amo cartas, pode me escrever que leio com muito carinho. No Orkut as pessoas são amigas, se reencontram e é o famoso vamos-marcar-de-fazer-alguma-coisa. Oi, quanto tempo, te achei, que legal, saudade da nossa turma e dos velhos tempos, vamos marcar uma cervejinha? E fica no papo. Você coloca o seu melhor você. As melhores fotos, os melhores jeitos, os melhores ângulos. Lá ninguém é bobo, feio, suado, vesgo, chato e tem o esmalte da unha descascado, todo mundo é legal e cheio de talentos. Canto, danço, represento. E minto.

Eu gosto é do gosto, já disse. É bem verdade que reencontrei alguns amigos através do Orkut e fiz alguns outros. Se não fosse a internet você não estaria lendo o meu blog e nem me conheceria. Se a tecnologia não existisse seria impossível você se esconder através de uma mensagem de celular. Você está querendo sair com aquela menina há dias. Falta coragem e sobra vontade, mas você é incapaz de ligar para ela, com medo de ouvir o sonoro "não". Mensagem: "Oi, vamos naquele boteco?". Ela, por sua vez, não liga, responde o torpedo. As pessoas se escondem atrás de nicks, codinomes, celulares, telas, tendências. Você entra naquela Comunidade porque sabe que determinada pessoa vai ver e dizer "nossa, como ela é segura de si". Você entra na Comunidade "Sim, eu tenho peito" pra dizer que é peituda. "Toda a Marianinha é linda", "Beijo bem, obrigada". Ei, não precisa nada disso. Com peito, sem peito, linda, feia, beijando bem ou não você é você. Você não é uma Comunidade, é uma pessoa!


Sempre achei uma nerdice sem fim conhecer alguém na internet. Falo do conhecer íntimo, conhecer conhecido, conhecer homem X mulher. Se é amigo tudo bem, mas pretendente...acho coisa de nerd. Parece que você é uma infeliz que entra em um site de encontros e o cara também e tá todo mundo bem louco atrás de um relacionamento sério. Então vou fazer uma revelação: conheci o meu namorado na internet. Não, não pense que eu estava cadastrada em algum site de "Eu quero casar antes dos 30", também não vá achando que ele chegou no meu Orkut e disse "Oi, gatinha". Odeio homem que chama de "gatinha" e o meu namorado não é um chinelo dessa espécie. Não vou me deter muito na história, afinal ela é só nossa, mas foi mais ou menos assim: temos um amigo em comum, só que eu não conhecia ele. Ele, o meu namorado. Então eu vi Ele no Orkut do meu amigo e fui lá dar uma olhada, sou curiosa e todo mundo sabe que no Orkut é um fuça-fuça-sem-fim. Então eu li o blog dele e vi que ele escrevia bem pra caramba. Meu nome ficou lá naquela coisa que entrega os curiosos, sabe? Ele, curioso que é, foi ver quem eu era. Oi, oi. Tudo bom, tudo bom. Pronto, a gente se conheceu. Tá, não foi assim tão simples, mas não vou ficar contando detalhes íntimos e sórdidos e embonitados e tão nossos. Resumo: conheci o meu namorado na internet, não de jeito nerd, não internerd. Não confunda as coisas, por favor.

Não quero que as pessoas se escondam, endureçam, virem pedra, saiam correndo. A internet é cômoda, acolhedora. Você pode ser quem quiser, o que quiser, quando quiser, da maneira que quiser. Milhares de adolescentes tímidos vivem para a internet. Mulheres separadas, homens solitários, crianças inocentes, gente carente, gente sozinha, gente precisando de abraço, beijo na mão, cafuné e colo. Fico com pena dessas pessoas, tão sozinhas. Conheço histórias fantásticas de gente que desfez casamento por causa de amores virtuais. Sei de pessoas que trocaram de país. Algumas deram certo, outras errado, a tela tem disso: você pode dizer o que quiser e ninguém descobre rápido. Mas você sabe que a verdade vem, nem que seja de carroça. Ou carruagem, é mais elegante.

O mundo está tão corrido, as pessoas não têm mais tempo. Ao invés de ir até a casa do seu amigo no aniversário dele você manda um torpedinho e se você esquece o Orkut te lembra, fique tranqüilo. O e-mail também te avisa, tem um programa que passa a lista completinha dos aniversariantes da semana. Acho triste, sou uma pessoa quente, gosto de sentir o calor dos outros, gosto de beijo, abraço, cheiro, cor, som. Hoje em dia você manda e-mail pra tudo: pra confirmar um jantar, pra desmarcar um cinema, pra mandar um beijo pra sua avó. Relações precisam ter cheiro, mas de qualquer forma tenho que agradecer duplamente: primeiro por ter conhecido o amor da minha vida. Segundo por ter sempre a sua companhia. Com tantas Caixas de Entrada não deixe de se comunicar olho no olho, boca na boca, mão na mão; não dê chance para que o outro se perca de você no meio de tanto @.com.br.


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