Entre parênteses

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(Porque o principal fica sempre protegido. Entre parênteses ou dentro do peito.)






Fiquei pensando (não faça essa cara de que-novidade-estupenda-nossa-ela-está-muito-criativa-hoje!) muito (desculpa, é fim de ano, tudo se potencializa, já penso em épocas normais, imagina agora?!?). Um amigo querido veio com um questionamento (sempre tivemos boa sintonia para assuntos complexos e infinitos, conversamos durante horas sobre coisas que não têm solução, muito menos saída aparente). O que você espera de um relacionamento?, ele perguntou. Pensei, mordi o canto da boca (o direito), doeu, passei para o esquerdo, doeu também, mordi o meio. Antes que eu ficasse sem boca parei com o morde-morde, afinal, não sou bicho (epa, depende do ponto de vista, mas vamos pular a parte de encontrar respostas, gosto mesmo é da magia que envolve o pensamento).
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O que eu espero de um relacionamento? Muitas espécies de palavras sobrevoaram a minha mente, dei uma remexida nos papéis lá de trás, aqueles que já estão amarelados, amassados (tá, encontrei uns rasgados e queimados também, sabe como é mulher nervosa...). A pergunta virou cambalhota na minha frente, deu uns dois saltos mortais e me deixou com a boca (mordida e doída) aberta. Eu espero o quê? Não sei. Há algum tempo atrás (muito, para dizer a verdade), eu me achava A (em negrito e em caps mesmo) entendida em relacionamentos. Sei de tudo, lido com tudo, trabalhamos com todos os tipos de emoções, sirva-se e bom apetite! Então eu cresci. É, porque a gente cresce, na base da cacetada (dói) e da queda (dói também, mas dizem que não há prazer sem dor, então vambora!).
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O amadurecimento se deu quando percebi que não sei muita coisa da vida, que não posso ter pré-julgamentos e uma visão única de tudo. As coisas possuem lados que eu nem sonho. Mas, cabeça-duramente, achei que não podia mudar de idéia, renovar a coleção de roupas de certos sentimentos e filosofias de vida. Que burrice! É muita estupidez fechar os olhos para todo o resto. Tem muito no resto. E a gente (idiotamente, imbecilmente, infantilmente) pensa que o resto é o final, o resto é nada. O resto (experimenta, experimenta!) é o começo do muito que você pode viver. Falar é fácil. Falar bonito, para mim, é mais fácil ainda. Difícil é absorver as palavras, deixar elas tomarem conta do corpo e das ações da gente.
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Ser feliz, ter paz, harmonia, uma coleção de sorrisos na prateleira, um monte de abraços dentro do saco do Papai Noel é muito bonito. Inglês gosta de ver isso. Talvez japonês também. Não é isso que a gente deve esperar de um relacionamento. Não, não estou na campanha de não-seja-feliz-não-tenha-paz-brigue-muito-estapeie-quem-você-ama. Só acho que ser feliz é muito pouco para esperar. Ser feliz é o final de tudo, senão, por que os filmes de romance terminariam com “e foram felizes para sempre”? Acredite (acredite mesmo, acredite muito) eu quero ser feliz para sempre. Mas sei que isso é impossível. Hoje estou mais realista (por favor, chamem os paramédicos, o tio da camisa de força e me dêem um remedinho na veia, urgente!), acredito que o impossível existe. Antes, ingenuamente, eu pensava que o impossível era apenas uma palavra sem sentido, uma palavra de preguiçoso, de quem não tenta. Só que ele é bem vivo, existe, incomoda e nos esfrega no olho o tempo inteiro que determinada coisa não vai acontecer. Não tem como ser feliz o tempo todo. Acho até que deve ser chato ser sorridente o dia inteiro, todos os minutos. Não sou a favor da briga (cof, cof, mas se tiver que brigar nóis briguemo!), prefiro uma boa conversa. Na verdade, sou a Rainha da Conversa. Converso em qualquer lugar: fila de banco, elevador, portaria, no meio da rua, no corredor, até na chuva. Acho que tudo se resolve conversando, mas conversando mesmo, deixando as palavras saírem desordenadamente. Quem pensa muito no que dizer acaba não falando tudo o que quer. A palavra magoa, dá tapa na cara. Mas é melhor levar uma bofetada palavral do que ser enganado mais adiante. Sinceridade é uma arma que pode ferir, eu sei. Ainda prefiro (de um estranho modo, confesso) ser assim.
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O que é a vida da gente senão uma repetição de dias, pessoas, cores, modos? Sentimento que se repete, sapato que se repete (a não ser que você seja a Carrie Bradshaw), família que se repete, cor do céu que se repete, mania que se repete. Você está enganado, nem tudo é igual todos os dias. Sentimentos são oscilantes, eles dão um passinho pra frente, por favor. Voltam, dobram na outra rua, estacionam, diminuem a velocidade, cometem excessos, inclusive levam multa salgada. A cor do céu nunca é a mesma, basta você ver. Porque eu conheço muita gente que enxerga mas não vê. O azul tem muitos tons. O sol tem muitas formas de aquecer. O cinza em alguns dias é mais cinza, em outros é menos. As nuvens nunca têm as mesmas formas. Você tem tempo pra ver? Pra se ver? Pra ser? Porque o querer hoje é o que está em evidência. Todo mundo quer, quer, quer. Olha, eu também quero. Papai Noel, eu quero muito. Quero que as pessoas ao meu redor, pelo menos uma vez na vida, vejam. Vejam como a simplicidade é importante, como aquece a alma da gente. Quero que as pessoas sejam. Sejam menos ambiciosas, menos audaciosas, mais calorosas, mais amorosas. Quero que elas sejam, sem máscaras, sem retoques, sem photoshop. Todo mundo é photoshopado, eu gosto é de gente. Preciso da repetição de mim, de saber que estou aqui todos os dias, vendo tudo muito diferente a cada minuto. Preciso da segurança que a repetição me traz, dos braços que ela me estica, do conforto que ela me dá.
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Continuo sem saber o que eu espero de um relacionamento. Talvez eu queira apenas que ele seja. E veja. E se repita. Eu esperava muito antes de te conhecer. Mas eu nem sabia direito o que esperava. Esperava sem saber ao certo o que tinha do outro lado. Sempre soube o que não queria, mas o que eu queria de verdade só fui descobrir quando te conheci. E continuo descobrindo, cada vez mais.
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