Ninguém mandou

By | 18:09

Achei graça. Recebi muitos e-mails perguntando se estava tudo bem, se eu andava feliz, o que tinha acontecido. Tudo por causa de um texto. Ou dois, nem sei. Estou bem, tá tudo bem. Sumi um pouco, coisas pra fazer, nem sempre consigo escrever como e quando eu quero. Não dá pra viver de palavras, descobri. Isso não quer dizer que eu vá pendurar as chuteiras, ou melhor, a caneta, a lapiseira, os dedos, o teclado. É que eu entendi. Descobri que nem sempre dá pra escrever escrever escrever escrever escrever assim sem vírgulas e pontos ou qualquer outra coisa. Eu só queria um tempo, bem pouco. Pra poder escrever escrever escrever assim sem vírgulas e pontos ou qualquer outra coisa. Mas nem sempre dá.


Andei reclamona. De tudo, sabe como é? Às vezes a gente nem tem do que reclamar, mas arruma. E olha, amiguinha, eu arrumo em menos de cinco minutos. O meu cabelo incomoda, a minha cutícula também. Não tenho a quantidade de sapatos que eu queria. Não tenho aquele corpo que eu tinha imaginado em um sonho qualquer, acho que foi em 1999, quando abri uma revista e pensei nossa, que corpaço, filha! Não tenho alguns muitos mil reais na conta. E, poxa, já viu que tudo circula em torno de beleza, dinheiro e homens? Quando a gente tem, reclama. Quando não tem, quer um. Que coisa, hein? Se a gente é bonita adora reclamar que os outros só nos enxergam como ah, que bonitinha ela. Se a gente é feia fica chorando as pitangas e querendo rasgar os cotovelos porque todas as fulanas com "f" minúsculo são mais atraentes. Se a gente é pobre pensa em tudo que queria ter. Se a gente é rica pensa em tudo que queria ter. Peraí, mulherio, vamos dar um tempo.


Sou super bem nascida. Não porque meu pai é milionário, mas porque cresci em um ambiente cheio de amor e presença. A presença é muito importante. Posso dizer que tive - e tenho - pais presentes. Tive educação, estudei em um dos melhores colégios da cidade, me formei no curso que eu queria, tenho bons amigos. Trabalho no que eu gosto, amo o que eu faço, vou publicar o meu livro logo, logo. Até que eu não sou de jogar fora, sabe? E tenho o amor da minha vida. O que mais a senhorita quer?, alguém pergunta. Tudo. Gente, eu quero tudo. Quero mais. A gente vai viver querendo e eu juro que preciso me acostumar que a vida é um eterno querer. Que frase brega.


Descobri que não tenho mais aquela paciência que eu tive um dia. É que cansa, sabe? Gente que sorri demais, é muito legal, quer forçar intimidade. Isso me incomoda. Não tenho mais saco pra sair quando não tenho vontade, pra ser obrigada a incorporar a cara de sou-muito-legal, pra congelar o sorriso e fazer cara de puxa-como-você-tem-um-papo-interessante. Não consigo mais. Não tenho mais paciência pra ser a querida, a amiga, a ouvinte, a conselheira, a que sempre tem uma boa palavra embaixo das axilas. Não. Eu cansei. Cansei de cara feia, de gente abusada, de gente falsa. E eu, que acreditei tanto nos outros, hoje percebo que nem tudo o que é dito é real. E eu, que acreditei tanto em mim, já me deixei muito na mão. E mereço muitas chibatadas - em praça pública, pra passar vergonha - por isso. E eu, juro, cansei de reclamar. Pelo menos hoje. É que reclamar cansa. Então eu tô saindo da cena da reclamação. Volto quando a cortina abrir novamente.
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