Pensei que era inteligente por dizer o que eu pensava muitas vezes. Tem coisa mais burra que isso? Existe sempre aquela certeza boa de tô-fazendo-a-coisa-certa. Aquele orgulho absurdo em dizer eu-falo-tudo-o-que-penso. O que a gente ganha com isso? Mudando a pergunta: o que a gente ganha se gabando de dizer todo o bê-a-bá que pensa?
O silêncio em alguns casos causa constrangimento. Uma prima distante visita seus pais. Você, que não a conhecia, fica sentada na sala interagindo com a bendita enquanto eles vão ali na padaria bem rapidinho. Quando se dá conta está falando pelos cotovelos e joelhos, não aguentou o silêncio. Traduzo: o silêncio só se esparrama no sofá quando você está ao lado de alguém que tem intimidade. É preciso muita cumplicidade para conseguir ficar sem falar uma frase sequer. Para ficar solta, sem ter a sensação que está vestindo um jeans dois números menor. Esse é um caso típico de vamos-falar-até-o-mundo-terminar. Quando alguém chega, ufa, missão cumprida, já que o entretenimento foi total nos intervalos comerciais, agora os outros podem assumir a programação.
Em outros casos, o silêncio é um bom amigo. A vida vem e vai, você vai e vem junto com ela. Passa por etapas, fases, aprendizados. Até que você dá de cara com o ensinamento da sua avó "nós temos dois ouvidos e uma boca". Isso quer dizer que temos que ouvir mais e falar menos. Para mim, confesso, isso sempre foi difícil, sou faladeira de carteirinha. Mas aprendi, levando de taco de beisebol no plexo solar, que a gente deve manter a língua fazendo ioga dentro da boca. Nem sempre podemos falar o que pensamos. Se eu dissesse tudo o que penso de todo mundo, suspiro fundo, eu estaria em coma no hospital. Teria apanhado muito, pode ter certeza. É o clássico ah, desculpa, estraguei o teu sapato. E você fala nem esquenta, não tem problema. Eu te dou outro. Não, não precisa, tudo bem. Enquanto isso, no seu cérebro, você pensa ah, é, filha da puta, também, né, com esse pé gigante e chulezento, égua de uma figa, eu devia era te fazer me dar três iguais a esse. Mas você é uma moça fina e guarda para si os pensamentos.
O silêncio é bem-vindo em casamentos. Principalmente naquela parte em que o padre pergunta se alguém tem algo contra o matrimônio e você sabe que a noiva foi chifruda um zilhão de vezes e tem vontade de pegar o microfone e gritar para todo mundo ouvir, mas fica quieta, sorridente e com cara de é-o-casal-mais-combinante-que-vi-na-vida-minha-gente.
Ah, o silêncio. Vou dizer-fazer-e-acontecer. Não vou ficar quieta não. Tenho razão, digo o que penso, sou gente fina, elegante e sincera. Você deve ter se identificado com alguma frase dessas. O silêncio, assim como a gente, cresce. Deixa de ser criança e se torna adulto, amadurece. A esperteza não está em responder tudo, em tomar atitudes, em responder provocações, em não deixar nada barato. E por falar em barato, claro que ninguém precisa ter sangue de barata. É só saber a hora certa de quebrar o silêncio e deixar a voz parir o eco.
As provocações precisam de ar puro, não podem ficar presas dentro da gente. É preciso abrir a janela e fechar as cortinas para que elas não aproveitem o embalo do ar e voltem para nos atormentar e nos fazer remoer o que passou. Não é possível debater tudo, rebater qualquer tipo de pseudoprovocação. O mais inteligente não é o que reage e vomita tudo o que pensa. Inteligente é aquele que fecha a cortina e ainda coloca um vasinho de flor no parapeito da janela. Dar a última palavra é para os fracos, que precisam se auto-afirmar e dizer a todo instante o quanto são os bons. Mas só deixando o silêncio entrar é que mostramos o quanto somos fortes.