Por trás da gramática

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Refleti um pouco sobre o significado das palavras. Sempre achei que as atitudes são mais valiosas que o blábláblá, mesmo porque muitas vezes o blábláblá não passa de nada. É aquela velha história: quem muito ameaça acaba não fazendo nada. Importante mesmo é a atitude, postura, a forma de agir.


A melhor forma de você dizer algo não dizendo é mostrar que se importa. Seja com uma pessoa, um fato ou com a sua própria vida. Existem mil maneiras não-verbais de demonstrar tudo e a melhor delas, com certeza, é a ação. Sou muito a favor da atitude. Fazer, fazer, fazer. A gente precisa fazer, mesmo que mais lá na frente perceba que fez errado. Aí é só fazer de novo, de outra forma. E se errar de novo, tudo bem, melhor morrer atropelado por tentar atravessar a rua do que morrer atropelado porque um caminhão desviou de outra pessoa e estacionou em cima de você.


Em contrapartida, as palavras têm muito significado. Muito do que foi dito jamais será esquecido. Pode ser contornado, resolvido, ajeitado, o que foi dito pode fazer as pazes com você, mas ficará lá, guardado. É por isso que lembramos tanta coisa da infância e outras épocas felizes e não tão bonitas assim. A gente participa de um festival de palavras diariamente. Tem a palavra que corta, a que salva, a que trai, a que ajuda, a que mata, a que cura, a que cola, a que remonta.


Nos últimos tempos, tenho me sentido um pouco recortada por dentro. Uma sensação inquietante de estar fazendo tudo errado. Nada Maria do Bairro ou sou-a-vítima-da-vez, mas um sentimento que não me abandona, como se eu estivesse o tempo inteiro andando na corda bamba, pisando em um chão gosmento e escorregadio. Conflitos incertos, talvez. Internos, certamente. Deve ser a crise dos trinta ou coisas de mulher. Já viu que quando a gente dá qualquer chilique é coisa-de-mulher? Frescurite, chatice, dramalhão, exagero, tudo coisa-de-mulher. Não sei, sou uma pessoa sensível. Penso que sou sensível demais. Fico magoada fácil, mas abro um sorriso gordo logo em seguida. E esqueço, esqueço mesmo. E se conto para você uma coisa muito minha, por favor, guarde. Não pegue o que foi dito e rediga em outra cena. É feio.


Gosto de ser tratada da mesma forma que eu trato. Se eu trato você com carinho, por favor, não me atire pedras, nem seja arrogante, não use palavras ásperas e que se alojam no fundo da gente. Meu fundo anda meio sem espaço, lotado de coisas, talvez sejam as tais coisas-de-mulher, vai saber. Falo muito do escutar, mas não ouvir. Gosto desse termo. A gente não pode só escutar uma pessoa, é preciso ouvir a alma dela. Observando, percebendo, querendo ver. Às vezes a gente diz que tá tudo bem quando nada está encaixado. Muitas vezes alguém dá bom dia e a gente responde só pra ser educado. Saber escutar e ouvir uma pessoa é enxergar quando o riso é riso, quando o choro é choro e quando tem algo preso na garganta, no peito, nas mãos. É ver a pessoa nua, sem nada, pelada. E logo em seguida trazer um cobertor, se estiver frio e um lençol, se estiver mais quentinho.


Nem sempre faço o certo, sei disso. Tenho as minhas neuras, loucuras, tosquices, animalices, ironias, tolices, surtos imaginativos fantasiosos perturbadores. Mas eu sinto, sabe? Sinto muito as coisas. Tudo, todos. Mesmo que eu tente esconder, mesmo que eu tente não me mostrar. Mesmo que eu disfarce. Eu sinto tudo demais. E é por isso que às vezes as coisas doem tanto. Mesmo que eu fique muda. Porque, apesar de parecer, nem tudo eu falo, muito eu guardo. Resolvo com o travesseiro, com a vida, com a mão na orelha da minha cadela. Fazer carinho na orelha peluda e fofa dela é uma coisa que me acalma.


A gente de vez em quando dá uns passos errados, nem sempre eu sei a hora certa de parar de brincar. Acontece, eu falo muita besteira. As palavras, de novo. Elas me acompanham sempre, mesmo quando eu durmo. Sonho com o alfabeto, livros me pegam pela mão. Não gosto de prisões, armaduras e imposições. Acho que pra viver é preciso respirar. Se for junto, melhor. Mas só se pode respirar junto se a gente sabe respirar separado. É aquela história da máscara de oxigênio: primeiro coloque em você, depois no outro. Não é egoísmo, mas pra poder ajudar alguém você precisa se ajudar.


Nem sempre eu sei falar. As palavras brincam de esconde-esconde, me dão sustos, pegam um avião para outro país. De vez em quando eu falo e falo e falo e não digo nada, não digo o que precisa ser dito. Não por esconder o jogo, mas por não saber dizer. Acho que a gente precisa, antes de apontar o erro dos outros, olhar para os nossos. E confortá-los. As palavras travam, não saem da minha boca. Por essa razão eu escrevo. Mas se algum dia eu parar de escrever, por favor, verifique imediatamente se eu estou respirando e se meu coração ainda bate.
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