A gente deve olhar para a própria vida e para os nossos erros antes de sair por aí dizendo coisas inacreditáveis sobre os outros. Por favor, me respeite. Nem sempre eu me respeitei. Muitas vezes me passei a perna, puxei meu próprio tapete, esqueci de mim e de tudo que eu queria, me maltratei. Muitas vezes me machuquei de propósito, me fiz sofrer gratuitamente. E me arrependo. Me arrependo, sim. Me arrependo, mesmo. Já me pedi desculpa, já me perdoei, não adianta a gente carregar uma cruz pesada, insuportável, não adianta a gente bater com a cabeça na parede e se ferir, a gente tem que se perdoar. Então, me perdoei.
Posso pedir uma coisa para você? Me perdoe também. Desculpa se às vezes falo sem pensar, se vomito as coisas de uma forma boba, se sou criançola, mimada e estúpida, se sou tão cabeça-dura a ponto de ficar cegueta. Desculpa se às vezes fico surtada e emburrada. Desculpa se meu orgulho é um dos meus piores defeitos. Desculpa se tenho um lado crítico bem forte. Desculpa se sou ciumenta com as minhas coisas. Desculpa se nem sempre eu sou doce. Desculpa se muitas vezes eu faço birra como se tivesse 5 anos de idade. Desculpa se eu não sou uma pessoa tão boa assim. Desculpa, desculpa mesmo. Desculpa se tenho sentimentos estranhos como inveja, preguiça e todos os sete pecados capitais reunidos. Desculpa por ter os defeitos que os seres humanos têm - e eu não gosto.
No ano passado, tive a minha primeira crise de pânico. Você já deve ter ouvido falar em Síndrome do Pânico. Não é mais um nome assustador. Não é uma doença da moda. Não é uma coisa que a gente só lê em livros. Não são meia dúzia de palavras na Wikipédia. É sério. É assustador. É difícil traduzir. Se fosse pra resumir em uma frase eu diria assim: você tem a nítida sensação que vai enfartar, que vai morrer e que ninguém vai poder te ajudar, te entender, te salvar. A gente se sente só e perdido. E fica com medo de ter outra crise. E fica com medo de tomar banho sozinho em casa. E fica com medo de dormir e morrer dormindo. E fica com medo de andar de avião. E fica com medo do elevador parar e você ficar preso. E fica com medo de coisas simples, como dor de garganta, braço dormente, dor de cabeça, pois tudo você relaciona à morte. E fica com medo da garganta fechar, do coração disparar, da mão suar, do pensamento sair correndo. E fica com medo de lugares fechados e cheios de gente. E fica com medo quando vai medir a sua pressão e ela está 18 por 10. E fica com medo do seu próprio coração, que dispara feito louco. A Síndrome do Pânico é um medo incontrolável, que te domina, que te faz deixar se ser quem você é, já que você fica refém do medo.
De alguma forma eu me culpei pelas crises. Por que eu não fui mais forte? Por que não segurei a onda? Por que precisei que minha mãe me ajudasse, já que na época meu namorado-marido estava viajando a trabalho? Por que eu precisava da minha mãe até para tomar banho? Por quê? Qualquer coisa me assustava, eu não tinha domínio sobre minhas emoções. É muito difícil explicar para quem nunca teve, pois parece exagero. Só quem já teve alguma crise, só quem passa por isso sabe o quanto é difícil lidar com a sensação de morte, com a sensação de pânico. Me senti pequena, me senti diferente, me senti louca, me senti diminuída. E a culpa era dele, o orgulho. A culpa era minha, pois nunca soube pedir ajuda, pois nunca soube dizer PRECISO DE VOCÊ. Eu era muda para essas palavras. Não conseguia, não saía, não me pertencia. Por isso, demorei pra pedir ajuda para a minha família, para quem me amava, para quem ia ficar ao meu lado. E hoje eu não me culpo, sei que isso pode acontecer com qualquer um, sei que ninguém é herói ou heroína, sei que não sou melhor nem pior por causa disso, sei que vou ter que conviver com isso até o fim da vida.
Uma noite, eu estava no nordeste, tinha acabado de tomar banho e estava com uma dor no braço direito. Lembrei que muita gente que tem AVC fica com dor no braço ou perna. Algo me dizia que aquela seria minha última noite de vida. Meu braço inteiro doía, eu não conseguia respirar direito, achava que ia morrer naquele momento. Então, o Francisco segurou minhas mãos, me ajudou a respirar, me disse que era uma dor normal, comum, que eu não ia ter nada. Eu não acreditei em uma palavra que ele disse, mas ele insistiu, me abraçou, eu chorei, chorei, chorei, de medo, de pavor, de tudo, chorei muito. E tomei um Frontal. Aquela sensação demorou a passar, mas foi passando, passando. E não morri.
Hoje, as crises diminuíram, quase não existem. Hoje, tomo medicamento (e em breve vou poder parar de tomar). Hoje, faço terapia uma vez por semana com um psiquiatra ótimo, excelente, que vale cada centavo que pago. Hoje, sou mais segura. Hoje, consigo andar de elevador sem suar. Hoje, tomo banho sozinha. Hoje, durmo sem medo de morrer. Hoje, não tenho medo de coisas simples. Hoje, a única coisa que ainda me deixa desconfortável é lugar muito cheio. Preciso de ar, preciso respirar, lugares lotados não me fazem muito bem. Hoje, não tenho mais medo de viver. Hoje, me perdoei por ter chorado de medo tantas e tantas vezes. Hoje, aprendi que posso conviver com isso. E que sou mais forte.